domingo, 13 de junho de 2010

Desvaneios...



Houve épocas em que perdi minha face. Não sei se em algum espelho dos versos de Cecília Meireles, ou pelo simples esquecimento. O tempo se encarregou de esmaecer as cores do meu passado. Preparei-me para o inverno na primavera. Trago alguns arrependimentos, mas não vivo de mágoas.

Joguei sozinho. Sem as regras do jogo factual. Trabalhei pelas trilhas de Recife, encontrei nas ruas a Saudade, a Concórdia, o Livramento. Conversei com o Capibaribe, no Poço e na Aurora. Trabalhei no Cais, onde as ondas ainda quebram nos arrecifes e o céu se avermelha nas tardes, minguando em tons púrpuras.

Encontrei-me na minha carreira e na minha Ciência Feliz. Corri demais e já não tenho pressas. Devagar com o andor, que o Pequeno é de Vencedor. Não ascenderei aos céus (marcou-me Caymmi - "pobre de quem acredita na glória e no dinheiro para ser feliz"...).

Estudei entre mosaicos e colunas de ferro retorcido. Fiz-me processo e nele vou adiante, descobrindo a cada dia novos passos. Aprendi a admirar as vítimas do tempo. Páginas desbotadas. Capas se desfiando em rosários. A poeira traçando novas letras, sobre as letras que se foram.

Ainda estudo todo dia e carrego a cruz de não conhecer tudo do que gosto. Mas os anos têm sido ricos de aprendizado. Ainda restam grilhões e sei que alguns não devem ser quebrados. Hoje contemplo (normalmente) tranquilo as mágoas lavadas no rio ao mar.

Por vezes, nada disso teve sentido, à falta de algo que reunisse em mim o que sou. Veio-me a advertência de Vinícius, “a oeste a morte, contra quem vivo, do sul cativo, o este é meu norte. Outros que contem, passo por passo”. Meu Nordeste. Provinciano. Severino. Busquei partes em tantos outros.

Nas Igrejas da minha vida deixei sempre os mesmos pedidos. Meu Deus sempre me ouviu, embora nem sempre compreenda Seus desígnios. Felizmente, não acredito em uma fé pela metade e me ponho aos seus pés. Franciscano, posto que não tenha os braços cruzados e carregue minhas chagas além do alcance dos olhos. Coincidência ou não, vim parar perto de Nossa Senhora da Conceição, nesta freguesia das Graças, tão perto dos outros Aflitos...

Arruinar-me... Podem, de fato, fazê-lo e, por vezes, com minha paradoxal ajuda. Mas edificarei outras colunas no lugar. Dóricas ou doídas. Salomônicas retorcidas. Projetar-se-ão novamente aos céus, como tributo à vida. "A vida apenas, sem mistificação".

Sinto-me acompanhado na rede da varanda e sozinho em meio às multidões. Descobri a alegria dos pequenos gestos de meus irmãos - e de dialogar, sempre. Sou apenas palavras a oferecer. Mais espírito que carne. Mais desejo que satisfação. Afeto prestes a nascer.

Trago, enfim, nos meus olhos, a minha terra, família e amigos. Uma cor fronteiriça, entre um Soneto do Desmantelo Azul e uma Valsa Verde. Aprisionar nos olhos o azul das coisas gratas ou mesmo o azul de cansaço. Vestir meus gestos insensatos. Transformar a tristeza cinza em valsa verde (intuitivamente ouvir os acordes da minha juventude e sair cantarolando). Este sou eu.

Texto escrito por Chico Barros e adaptado em alguns versos por mim.

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